Título único
Policy Paper com base na moderação do Marcus Marktanner e contribuições dos participantes do workshop realizado pela Fundação Konrad Adenauer e pelo Projeto Saúde e Alegria, em Santarém/PA, entre os dias 19 a 22 de junho de 2017, reunindo representantes de vários setores – organizações da sociedade civil, acadêmicas, governamentais, empresariais e de comunicação – para refletir sobre modelos econômicos para Amazônia.
Brasil, 31.07.2017
O conceito de Economia Social de Mercado foi desenvolvido na década de 1930 como resposta à crise do capitalismo de livre mercado e ameaça à liberdade política e econômica a partir da ascensão do socialismo e do fascismo.
Mas, o que isso tem a ver ou que esse modelo pode nos dizer para os desafios sociais, econômicos e ambientais da região amazônica?
Essa foi uma das principais reflexões do workshop de Santarém, em meio a um Brasil com enormes desigualdades, ao mesmo tempo um dos maiores detentores de ativos naturais do Planeta. Um país que ingressou nos anos recentes em uma profunda crise econômica e politica, num ambiente de mais embate do que debate, polarizado entre defensores ora de modelos muito estatizantes ora muito liberais.
Desta forma, não deixa de ser oportuno trazer a experiência do modelo alemão, onde já se sabe que nem tudo se resolve só pelo Estado ou só pelo Mercado. É preciso equilibrar a liberdade no mercado com o desenvolvimento social equitativo. O papel do governo deve ser desmantelar todas as discriminações estruturais para obter a igualdade de oportunidades.
No caso da Amazônia, como os mercados podem ser uma fonte de desenvolvimento social equitativo e ambientalmente sustentável se multinacionais que operam em mercados globais largamente exploram as riquezas dos recursos naturais da região?
A resposta é que a ordem econômica do mundo real não tem muito a ver com a ordem de concorrência ideal defendida pela Economia Social e Ambiental de Mercado, cuja perspectiva a região amazônica não sofre com concorrência excessiva, sofre com a sua falta. Porém, a ordem econômica existente no Brasil tem feito crescer as desigualdades no país.
Infelizmente, o que deveria ser exceção ainda é regra. A cultura da ilegalidade continua prevalecendo e desestimulando investimentos com responsabilidade socioambiental, base do que deveria ser o mercado ideal. Proprietários ou Empresas que investem em boas praticas, como por exemplo o manejo sustentável da floresta, sofrem com a concorrência desequilibrada, tendo que enfrentar os preços baixos da madeira extraída de forma ilegal, sendo comum retraírem os investimentos socioambientais ou se verem obrigados a mudar de lado. Enfim, ainda há muitos que ganham mais dinheiro derrubando a floresta do que conservando-a.
Eis aí um bom exemplo do que se tratou no workshop, não apenas trazendo uma melhor compreensão do que representa a Economia Social e Ambiental de Mercado (ESAM), mas também de quanto é diferente do que observado no mundo real, e de como sua visão pode contribuir na elaboração de recomendações de políticas para a região amazônica.
O conceito da ESAM pode ser construído, essencialmente, a partir da resposta a quatro perguntas:
(1) Como deve ser organizado o Estado?
(2) Como deve ser organizado o mercado?
(3) Quando o governo deve interferir no mercado? e
(4) Se o governo deve interferir no mercado, como deve fazê-lo?
Desta forma, voltando ao exemplo apresentado, os princípios da ESAM orientariam pelo nivelamento pelas melhores práticas, evidenciando como modelares os empreendimentos com séria responsabilidade socioambiental – sejam de fazendeiros, madeireiros, entre outros poucos. Desta forma essas boas práticas poderiam ser reforçadas para torná-las predominantes.
Na ESAM, o princípio constitutivo de Estado é a subsidiariedade democrática. Ela determina que qualquer problema que possa ser solucionado por uma instância menor não deve ser tratado por um grupo maior. Problemas no nível local deveriam ser solucionados democraticamente pelas partes interessadas locais, e o mesmo vale em relação às instâncias estaduais e nacionais. Somente depois de esgotar todas as possibilidades de resolver seus próprios problemas, uma instância menor deverá solicitar a solidariedade da comunidade mais ampla.
Quanto mais próxima dos desafios estiver a capacidade de resolução dos problemas enfrentados por determinado grupo, maior será a eficácia em sua resolução. Entende-se que a subsidiariedade democrática aumenta o envolvimento comunitário, aperfeiçoa os mecanismos de freios, contrapesos (checks and balances), e fortalece a transparência.
Sem subsidiariedade democrática e a liberdade política em que esta implica, é impossível haver liberdade econômica. Da mesma maneira que mercados competitivos de bens e serviços alocam com maior eficiência recursos escassos para a produção de bens e serviços privados, também é necessário um mercado político competitivo para encontrar o melhor uso de recursos escassos para produzir bens públicos como hospitais, escolas, projetos de infraestrutura, ou estratégias de preservação da base de sustento.
O debate durante o workshop revelou que a realidade amazônica permanece distante do princípio das subsidiariedade democrática. O processo histórico mais extraiu do que trouxe riquezas para região, com grande impacto ambiental associado e enormes contradições sociais. Por um lado, a Amazônia supre o Planeta com produtos florestais, agropecuária, minérios, hidrocarbonetos, energia, além de serviços ecossistêmicos fundamentais para conservação da biodiversidade, ciclos hidrológicos e regulação climática. Por outro lado, tais riquezas não se converteram em benefícios concretos para o amazônia, marginalizado do debate em torno da construção do projeto de desenvolvimento para sua região.
Seja no Brasil como nas demais nações pan-amazônicas, são nas áreas ocupadas pelo seu bioma onde se encontram os piores indicadores sociais, em sua maioria abaixo das respectivas médias nacionais:
O fato é que, até então, a manutenção da floresta em pé não conseguiu competir com os ganhos imediatos de processos alimentados pelo atual modelo econômico, com forças de mercado longe das ideais.
Jamais se resolverá o ambiental sem respostas ao social. Se todos perdem com a degradação ambiental, no curto-prazo são as populações mais pobres as mais afetadas, que residem nestes países ainda com grandes ativos naturais, vitimas de conflitos da diminuição dos recursos de subsistência, contaminação dos rios e proliferação de doenças. Isto tudo em um cenário de ausência ou insuficiência do Estado e respectivas politicas sociais, em especial nas áreas mais remotas. A conservação da biodiversidade tem custos, que são locais, embora os benefícios sejam globais. Por isso são precisos ferramentas de financiamento desenvolvidas pela comunidade que tomam em conta as situações econômicas dos diferentes países.
Portanto, os desafios são muito mais complexos do que se imagina nesse caminho em direção a uma maior subsidiariedade democrática. Ao mesmo tempo, a região amazônica é intrinsecamente interconectada, tratando-se de uma multiplicidade de bacias hidrográficas e ecossistemas interdependentes. Decisões tomadas numa determinada região têm consequências muito além da sua origem. É fundamental que se empoderem as populações da região, assim como mais diálogos e colaboração horizontal nos níveis local, estadual e nacional. Sem mudanças de rumo, não se avançará no sentido de administrar mais eficazmente a riqueza dos recursos naturais, a biodiversidade e a dependência destas para o sustento de seus povos, sem falar na redução dos conflitos sociais e da instabilidade politica.
Na ESAM, o Governo é frequentemente comparado ao árbitro de uma partida de futebol, que zela para que os jogadores se atenham às regras do jogo. Quando ocorrem certas dinâmicas que são explicitamente identificadas como falhas do mercado, cabe ao Estado encaminhar as devidas ações corretivas – por exemplo, dinâmicas como desenvolvimento social desigual, poder de mercado abusivo e degradação ambiental, todas três dinâmicas presentes e que interagem na região amazônica. O problema é quando o governo não corresponde ao nível de integridade política necessário ao exercício de sua função, sendo percebido como tendencioso.
A ausência ou a insuficiência da presença arbitral do Estado faz com que muita atividade econômica na região amazônica seja realizada, efetivamente, de forma não regulada. O fato que as comunidades na região amazônica muitas vezes não têm direitos de propriedade e usufruto das terras locais é fonte de muitos problemas e contribui à formação de preços para recursos naturais da região muito em baixo do valor que realmente reflete a sua escassez. Aquilo ainda é agravado pela ausência de regras de responsabilidade civil que assegurem uma compensação adequada para as comunidades locais quando uma atividade econômica causa degradação ambiental.
Contrariamente ao status quo, a ESAM aponta que é responsabilidade do governo árbitro garantir que o Estado de Direito esteja presente na realidade da sua população, assegurando direitos de propriedade e usufruto assegurados e regras de responsabilidade civil no caso de degradação ambiental.
Em linhas gerais, o workshop demonstrou que muitos dos princípios de uma Economia Social e Ambiental de Mercado podem servir como referências na busca de caminhos para conciliar conservação, inclusão social, crescimento econômico e o desenvolvimento da região.
O Brasil precisa entender a Amazônia com suas realidades, desafios, culturas, potencialidades e oportunidades, sobretudo o principal centro econômico e de formação de opinião, o eixo Rio de Janeiro – São Paulo.
Só assim deixará de enxergar a Amazônia como um ônus onde só existem conflitos e desmates e perceberá o bônus que tem nas mãos - de importância estratégica crescente em tempos de aquecimento global, do futuro com economias de baixo carbono, acordos internacionais em torno da distribuição dos benefícios da biodiversidade e serviços ambientais.
A Amazônia representa uma oportunidade única para que se alcance um modelo de desenvolvimento inovador e sustentável, que promova condições dignas de vida a seus habitantes, assim como estabeleça um ambiente de negócios estimulador de investimentos que valorizem o patrimônio da sociobiodiversidade e as vocações regionais.
Para tal, os custos de um processo como este são maiores, mas os retornos sociais, ambientais e econômicos, no médio e longo prazos serão significativamente compensatórios, com a diferença de que serão duradouros e não efêmeros, seja para a população local, para o país e para o Planeta.
Ter a soberania sobrea maior parte da Amazônia, além da imensa responsabilidade, é também um privilégio exclusivo desta nação. As escolhas do Brasil em relação a esta região poderão determinar não apenas o estabelecimento de novos paradigmas de desenvolvimento para o país, como também sua liderança no âmbito internacional para um futuro mais harmônico, equilibrado e sustentável de nosso Planeta.
Autores:
Marcus Marktanner, Professor Associado de Economia, Kennesaw State University, EUA
Caetano Scannavino Filho, Coordenador, Projeto Saude e Alegria
Eugenio Scannavino Netto, Coordenador, Projeto Saude e Alegria
Jan Woischnik, Diretor, Fundação Konrad Adenauer Brasil
Alexandra Steinmeyer, Representante Adjunta, Fundação Konrad Adenauer Brasil
Dal Marcondes, Diretor Executivo, Instituto Envolverde
Caio Magri, Diretor – Presidente, Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social
Bruno Gomes , Sócio, Humana - Serviços em Sustentabilidade; Secretário técnico, Grupo de Diálogo Latino-Americano: Mineração e Desenvolvimento Sustentável
Socorro Pena, Coordenadora do curso de Gestão Publica e Desenvolvimento Regional, Universidade Federal do Oeste do Pará; Vice Presidente, Sociedade para a Pesquisa e Proteção do Meio Ambiente
Contribuições:
Joci Aguiar, Presidente, REDE Grupo de Trabalho Amazônia; Coordenadora Geral, Rede Acreana de Mulheres e Homens
Coordenação Editorial:
Alexandra Steinmeyer, Representante Adjunta, Fundação Konrad Adenauer Brasil
Tópicos
„Politisches Engagement bedeutet, auf den gesellschaftlichen Zusammenhalt zu setzen“
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