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Um balanço das relações Brasil e Colõmbia: Desconfianças e convergências

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Fabio Borges

1.Introdução: as relações distantes entre Brasil e Colômbia

Tanto do ponto de vista geográfico (falta de infraestrutura de integração) quanto geopolítico, as relações entre Brasil e Colômbia apresentam um padrão de certo distanciamento. Uma das razões pela baixa intensidade nas relações entre os dois países dizem respeito à Amazônia até esse momento representar mais um obstáculo do que um instrumento de integração nas fronteiras entre Brasil e Colômbia. Em relação à geopolítica, a influência muito intensa dos Estados Unidos da América (EUA) no combate às drogas no país andino desde o final dos anos 1970 despertou desconfianças nos formuladores de política externa brasileiros.

O argumento central desse artigo é que as relações entre o Brasil e a Colômbia passaram por três momentos em linhas gerais: 1- das Independências de ambos os países (Brasil – 1822 e Colômbia - 1819) até o final dos anos 1970, um período de desconhecimento mútuo e distanciamento; 2- do final dos anos 1970 até 2000 marcado pela grande influência dos EUA na política de combate às drogas e às guerrilhas na Colômbia gerando preocupação e desconfiança por parte brasileira; 3- da proposta da Iniciativa de Integração da Infraestrutura Regional Sul-americana (IIRSA) em 2000 até os dias atuais caracterizado por certa convergência de interesses entre os dois países, com o Brasil tentando liderar um processo de integração física aparentemente benéfico para todos os países da região e com a Colômbia buscando diversificar a sua agenda de política externa historicamente muito centrada somente na questão da Segurança Nacional. Esse trabalho contém, além da introdução, as seguintes partes: 2. Desconfianças: sub-imperialismo brasileiro, drogas e segurança regional; 3. Convergências: comércio e a IIRSA; e por fim, as conclusões.

2.Desconfianças: sub-imperialismo brasileiro, drogas e segurança regional

Desde 1813 Simón Bolívar pregava uma união fraternal entre os povos do mundo americano. Para esse fim organizou o Congresso do Panamá em 1826, porém como afirmou a pesquisadora Maria Tereza Spyer Dulci embora o Congresso do Panamá tenha tido aspirações continentais, seu programa previa somente a reunião dos governos hispano-americanos. O Brasil não participou do Congresso do Panamá, pois segundo a autora citada “o governo imperial tinha receios de estabelecer uma aliança com os vizinhos hispano-americanos, ‘anárquicos’ e ‘instáveis’”. Por um lado, explicou que essa aliança poderia entrar em choque com a própria questão de legitimidade do Estado monárquico, uma vez que o Brasil seria o único país que adotava esse regime político e era governado por um português da dinastia de Bragança; e por outro, o Brasil também despertava desconfianças nos recém independentes países latino-americanos pelo seu regime escravista e imperial .

A desconfiança mútua perdurou por muito tempo, tanto que até recentemente é possível verificar posições colombianas de preocupação com um possível sub-imperialismo brasileiro. Por exemplo, é bem interessante a colocação feita por Socorro Ramírez quando diz que:

(…) em tempos recentes, distintos meios colombianos manifestam certo temor ante o Brasil. Alguns militares expressaram a ideia do “sub-imperialismo” brasileiro, a derivando da magnitude geográfica e populacional do país vizinho, de seu poder militar, do pensamento geopolítico elaborado por seus colegas brasileiros para os territórios fronteiriços, e em particular para a Amazônia, assim como a pretensão brasileira nos anos sessenta e setenta de exercer uma liderança regional, quando, além disso, mantinha uma estreita relação com os Estados Unidos. Em sentido similar, alguns diplomatas colombianos têm pedido cautela no apoio da pretensão do Brasil de liderança regional porque possuem a imagem de que a nação vizinha somente toma em consideração seus próprios interesses e joga segundo sua conveniência como outsider ou como “irmão maior” .

O ápice da desconfiança mútua entre os dois países ocorreu em 1999 com o lançamento do Plano Colômbia (PC) que gerou muitas preocupações por parte dos formuladores da política externa brasileiros em virtude da influência enorme dos EUA nessa iniciativa. No projeto estava escrito que o PC buscava beneficiar, por uma parte, a população vítima da violência, em especial a população que se viu forçada a se deslocar como resultado da disputa pelo controle territorial entre os diferentes atores armados, e de outra, a população camponesa vinculada aos cultivos ilícitos .

Em relação à contribuição estadunidense, Betancourt e Martínes apontam que os recursos se destinariam a dois grandes usos: em primeiro lugar, um forte investimento para o combate aos cultivos ilícitos e a proibição, que concentrava mais de 81% dos recursos, destinados para a Polícia Nacional, que tradicionalmente está encarregada das operações contra narcóticos, e ao fortalecimento das forças militares para esses fins. Em segundo lugar, os recursos se destinariam ao fortalecimento institucional contra os delitos relacionados com as drogas psicoativas, atenção aos deslocados que resultariam da aplicação do PC e para a substituição de cultivos ilícitos.

Com o mandato de Álvaro Uribe (2002-2010), a presença quase permanente do comandante do Comando Sul dos EUA no desenvolvimento das operações do PC indicou a enorme influência do complexo militar-industrial estadunidense sobre a Colômbia, e o aproximou perigosamente de uma participação cada vez mais direta no conflito armado colombiano e condicionou, de maneira negativa, as opções de regresso a uma possível solução política negociada .

Consequentemente o tema da Segurança Regional gerou muitas divergências entre o Brasil e a Colômbia, mas também perspectivas de cooperação, como podemos observar no trecho a seguir escrito por Socorro Ramírez:

Do lado colombiano, certos atores governamentais e militares assim como membros das agências de inteligência e de segurança pública percebem como fonte de insegurança os desacordos brasileiros com as políticas colombianas de “Segurança democrática”, e as relações políticas de certos setores brasileiros com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC). Alguns grupos em diversos meios se irritam que setores brasileiros não vejam suas próprias implicações no problema das drogas, senão que assumem como um problema exclusivo da Colômbia, que transferiria drogas, traficantes e guerrilheiros ao lado brasileiro da fronteira .

A mesma autora argumentou que esses atores colombianos acreditam que essas percepções brasileiras pressionavam contra qualquer entendimento em matéria de defesa e segurança para fazer frente a problemas comuns e abriu caminho para uma perigosa xenofobia anticolombiana. Por outro lado, acrescentou que outros setores de caráter governamental, acadêmico e de formadores de opinião, mais do que perceber ameaças, observaram oportunidades e chamaram a atender as preocupações brasileiras em matéria de segurança para, a partir delas, construir formas de atuação conjunta frente a problemas comuns e mecanismos para uma possível colaboração do Brasil .

Aprofundando as razões dos desentendimentos entre Colômbia e o Brasil diz que além das diferenças nas percepções da natureza e forma de tratar o conflito colombiano, os grandes problemas são a desinformação e o desconhecimento mútuo. Completa:

Por um lado, o centro das preocupações que tem muitos colombianos está apenas nas urgências nacionais, um grande localismo e uma informação guiada por pré-conceitos. Por outro lado, para os brasileiros a informação que fornecem os meios de comunicação frequentemente reduzem a situação colombiana à violência, o que não ajuda a entender a evolução do conflito e nem a existência de uma saturação nacional com a confrontação. (...) Estas diferenças de perspectivas dificultam a construção de relações mais sólidas e de mecanismos compartilhados em matéria de segurança .

Essas diferenças nas percepções de como se combater às drogas na região se reproduzem também nas distintas visões sobre os problemas ambientais na Amazônia.

Por exemplo, a pesquisadora Constanza Ramírez apontou que as fumigações dos cultivos ilícitos têm sido até o momento desastrosas em termos de perda de biodiversidade, isso por que: (1) tem deslocado os cultivos para dentro da selva e conduzido os cultivadores a realizar plantações em terrenos de bosques, costa de páramos ou selvas para recuperar o dinheiro investido no cultivo perdido e; (2) na medida em que momentaneamente se diminui a oferta, a fumigação tem contribuído para manter altos os preços dos cultivos, estimulando os cultivadores a conservar a produção com segurança de retorno dos seus investimentos .

Pelo lado brasileiro, segundo o Itamaraty, o governo Fernando Henrique Cardoso estava atento e preocupava-se com uma possível utilização de fungos contra os cultivos ilícitos que poderiam contaminar a rede fluvial brasileira, principalmente os rios Iça e Japurá .

“A grande preocupação para nós é a guerra biológica na Amazônia. O Brasil tem que se precaver se forem usar os fungos, como o Fusarium oxysporum, que podem atingir também outros cultivos, não ilícitos, que são de sobrevivência dos camponeses da região. Além do mais, quem garante que essas armas biológicas não possam atingir a Amazônia brasileira? As fumigações (com utilização de produtos químicos espalhados por aviões, que matam não só as plantações de coca e papoula, mas os cultivos normais, de subsistência, ambos desenvolvidos pelos camponeses) já foram feitas nos últimos oito anos e a área plantada de coca cresceu 30%”, advertiu Walter Maierovitch, ex-secretário nacional antidrogas e presidente do Instituto Brasileiro Geovanni Falconi, dedicado ao estudo de assuntos como criminalidade organizada .

A já citada pesquisadora Socorro Ramírez argumenta que as questões amazônicas e ambientais são percebidas de maneira distinta tanto pela Colômbia como pelo Brasil. Com clareza a autora diz:

Na Colômbia meios vinculados às negociações ambientais possuem a percepção de que, em sua atividade, os representantes do Brasil assumem a questão amazônica como se fosse um assunto exclusivamente seu e não buscam atuar conjuntamente com os países que compartilham a responsabilidade por essa zona, em particular com os andinos. Ao mesmo tempo, consideram que os brasileiros mostram incoerência entre seus discursos nas tribunas internacionais de proteção da Amazônia e as concessões madeireiras e empresariais, que carregam destruição, sendo defendidas pelo Brasil como um esforço para evitar a sua desnacionalização e a ingerência externa. Por outro lado, para setores brasileiros, a Colômbia tem visto a Amazônia apenas como um assunto de zonas distantes de colonização e mais recentemente de problemas de segurança, enquanto para o Brasil é parte central de sua identidade e de seus interesses nacionais .

Por paradoxal que possa parecer, apesar das diferenças ideológicas entre os ex presidentes Álvaro Uribe Vélez e Luiz Inácio Lula da Silva, o período entre 2002 e 2010 marcou certa aproximação entre os dois países. Atendendo ao convite formulado pelo presidente da Colômbia, Lula visitou a Colômbia no dia 14 de dezembro de 2005. Após o diálogo e determinados a continuar aprofundando o entendimento e a cooperação entre ambos os países, os presidentes firmaram uma Declaração Conjunta. Os dois primeiros pontos dessa declaração diziam respeito a que os presidentes reiteravam seus compromissos com a democracia, a promoção do desenvolvimento econômico e social, a luta contra a pobreza, a fome e a discriminação. Os presidentes também apontaram a intensa cooperação existente entre as autoridades militares do Brasil e da Colômbia, salientando a eficiência dos instrumentos atualmente em vigor para o combate às atividades ilícitas na região de fronteira. Destacaram, a esse respeito, o “Acordo de Cooperação para o Combate ao Tráfico Ilícito de Aeronaves”, firmado em 1997, o “Memorando de Entendimento Brasil-Colômbia sobre Cooperação em Matéria de Defesa”, assinado em 2003, e o “Memorando Tripartite Brasil-Colômbia-Peru para Combater Atividades Ilícitas nos Rios Comuns”, firmado em 2004 .

Essa aproximação entre os dois países estaria condizente com a análise feita pelo professor Jaime Caycedo. O autor apontou que todos percebem os perigos que derivam de uma situação tão complexa como a que envolve o conflito interno na Colômbia, e acrescentou que sua solução é cada vez menos um assunto puramente colombiano e converte-se numa necessidade da América Latina e do Caribe para viver em paz, estabilidade, soberanamente, e progredir na solução de seus problemas sociais .

Reforçando essa tendência de transbordamento (spillover) dos conflitos colombianos para os países vizinhos, em 1º de março de 2008 houve a crise entre Equador e Colômbia, em virtude do ataque de militares colombianos a membros das FARC em território equatoriano e que matou Raúl Reyes, número dois da guerrilha. Pouco depois e em circunstâncias não totalmente esclarecidas até hoje, morria também o fundador e membro mais importante das FARC, Manuel Marulanda, conhecido como “Tiro certo”. A debilitação das FARC pareceu clara no resgate da ex-candidata presidencial Ingrid Betancourt e de mais 14 reféns em 2 de julho de 2008 em uma ação quase cinematográfica . Mais recentemente deram-se outras libertações, entre elas foi libertado dia 5 de fevereiro de 2009 pelas FARC o ex-deputado Sigifredo López que estava em cativeiro havia quase 7 anos. Foi resultado de uma missão humanitária organizada pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) com o apoio logístico do Exército brasileiro .

Dois pontos merecem destaque nesse momento: o tratamento dos conflitos colombianos como um assunto de Segurança Regional e a participação do Brasil na tentativa de resolvê-los, seja com apoio logístico como descrito anteriormente, seja com a criação da União da Nações Sul-Americanas (UNASUL) e posteriormente, do Conselho de Defesa Sul-americano (CDS) em 2008 .

Do lado da política externa colombiana é importante ressaltar que ela apresentou algumas novidades quando Juan Manuel Santos assumiu a presidência em 2010, conforme análise dos professores Eduardo Pastrana e Diego Vera:

A política externa colombiana vem experimentando algumas mudanças interessantes em meio a continuidades. Na era Santos, a Colômbia vem marcando alguns distanciamentos importantes frente à política exterior característica dos oito anos sob o governo de Álvaro Uribe Vélez, basicamente pela forma de liderança presidencial “delegativa” ou gerencial em lugar do “dirigismo”, o tom ideológico oficialista de “centro-direita” com capacidade de realizar múltiplas coalizões políticas, e a diversificação geográfica e temática.

Nesse sentido é muito interessante entender porque o país andino decidiu participar do CDS, posicion amento muito ansiado pela diplomacia brasileira. Também importante notar que a Colômbia é o país que mais teve representantes exercendo o cargo de Secretário Geral da UNASUL, María Emma Mejía, entre maio de 2011 e junho de 2012, e o ex presidente colombiano Ernesto Samper Pizano, desde 22 de agosto de 2014 ainda em exercício . Parece interessante recordar que foi justamente no período do governo Samper (1994-1998) que houve a maior crise nas relações entre os EUA e a Colômbia , sendo simbólica a sua presença em uma organização que parece em certa medida se contrapor aos interesses da potência do norte na América do Sul.

Os já citados professores Eduardo Pastrana e Diego Vera explicaram que com o desenvolvimento das Medidas de Fomento a Confiança e Segurança (MFCS) no CDS, o governo colombiano passará de uma postura crítica da “falta de dentes” dessa estrutura regional para outra em reconhecê-la como o motor para o cumprimento de valores comuns como a transparência, o civilismo e o multilateralismo. Concluem com uma análise muito interessante:

Esse cenário de construção de uma comunidade de segurança a partir da interação colombo-brasileira é possível interpretar desde uma perspectiva competitiva até outra cooperativa. Em relação à primeira, é inquestionável que se for considerada a recuperação do círculo tradicional de influência colombiano (a região andina e o Caribe), a Unasul e o CDS representam para a Colômbia a oportunidade de exercer uma liderança renovada e evitar que a política regional e sub-regional sejam totalmente marcadas pelo polo brasileiro (evitando a sua hegemonia) ou pelo ímpeto competitivo de outra potência secundária como a Venezuela, que encabeça a ALBA e está sumamente interessada na penetração ideológica da Unasul. .

Já na dimensão cooperativa os últimos autores citados argumentam que a concertação dos poderes na UNASUL acoplados a processos de institucionalização democrática e de mecanismos de representatividade proporcional, pode conduzir a Colômbia e outras potência secundárias a persuadir ao Brasil a aportar mais recursos na segurança e infraestrutura regionais (liderança distributiva) e de compartilhar poder com os Estados secundários, os incluindo na tomada de decisões em nível regional (liderança multilateral).

3.Convergências: comércio e a Iniciativa de Integração da Infraestrutura Regional Sul-americana (IIRSA)

Com Juan Manuel Santos assumindo a presidência em 2010 houve uma reaproximação entre o Brasil e a Colômbia, tanto que logo após a Cúpula de Brasília de 2010, foram assinados 8 acordos bilaterais com os seguintes objetivos, entre os principais: buscar gerar desenvolvimento e intercâmbio social na fronteira entre Letícia e Tabatinga, facilitando autorizações de residência, estudos e trabalho; melhorar a cooperação policial em termos de investigação, capacitação e intercâmbio de informações criminalísticas, antidrogas e de tráfico de precursores; motivar a pesquisa científica e acadêmica entre o Departamento Administrativo de Ciência, Tecnologia e Inovação da Colômbia (Colciencias) e a Capes do Ministério de Educação brasileiro; o Brasil oferecer assistência técnica ao cultivo e transformação do cacau e da borracha; fomentar o desenvolvimento fronteiriço comum com financiamento da Corporação Andina de Fomento (CAF) ao Estado do Amazonas no Brasil e aos Departamentos de Amazonas, Vaupés e Guainía na Colômbia para propiciar infraestrutura, emprego e proteção ao meio ambiente, entre outros .

Disso pode-se inferir que realmente as relações bilaterais entre Brasil e Colômbia estão passando por um momento de diversificação de temas e de aproximação, como poderemos também confirmar com os dados sobre comércio entre os dois países em anos recentes. Entre 2002 e 2014 as relações comerciais entre Brasil e Colômbia se intensificaram significativamente com as exportações brasileiras subindo de aproximadamente 640 milhões de dólares em 2002 a um ápice de 2,8 bilhões em 2012 e se situando em cerca de 2,4 bilhões no ano mais recente. Já as importações vindas da Colômbia saltaram de um valor de 116 milhões de dólares aproximadamente em 2002 para uma valor de mais de 1,8 bilhões em 2014 como poderemos observar na tabela e gráfico seguintes:

É possível também observar que apesar do Brasil sempre apresentar superávit comercial com o vizinho amazônico, as importações cresceram em um ritmo mais acelerado do que as exportações nos últimos anos, equilibrando um pouco mais essas relações. Porém, o mais importante de tudo, é notar que a corrente de comércio (Exportações somadas as Importações) saltaram de um valor de aproximadamente 750 milhões de dólares em 2002 a mais de 4 bilhões em 2014, ou seja, uma efetiva aproximação entre os dois países.

Em relação aos investimentos cruzados entre os dois países os professores Eduardo Pastrana e Diego Vera argumentaram que a impetuosa entrada do empresário colombo-brasileiro, Germán Efromovich, e seu grupo Synergy (Avianca) em 2004 estimulou a entrada de outras empresas com destaque para a Votorantim, Sandvik, Petrobras e Gerdau, o que demonstrou o crescente interesse dos investidores brasileiros nos setores de energia (carvão, petróleo), mineração, manufaturas e metalurgia na Colômbia .

Com o objetivo de aumentar a sua competitividade internacional e uma melhor inserção internacional da região no mundo, o Brasil propôs em 2000, em Brasília, a Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-americana (IIRSA) que consiste em um fórum de diálogo entre as autoridades responsáveis pela infraestrutura de transporte, energia e comunicações nos doze países Sul-americanos. A IIRSA tem como objetivo promover o desenvolvimento da infraestrutura sob uma visão regional, procurando a integração física dos países da América do Sul e alcançar um padrão de desenvolvimento territorial equitativo e sustentável .

O pesquisador Sean Burges explicou porque às vezes iniciativas brasileiras aparentemente não relacionadas no contexto Sul-americano provem um claro quadro de como o Itamaraty atua no avanço da agenda internacional do Brasil. Nesse sentido, o autor desenvolve a noção de “hegemonia consensual” (consensual hegemony) relacionada com o papel do Brasil na América do Sul. Ele afirmou que:

Nuança é importante. Concepções tradicionais de liderança dizendo respeito a formas de coerção e dominação jogaram um pequeno papel na postura adotada pelo Itamaraty durante a era Cardoso. Em vez disso, um novo estilo de liderança foi desenvolvido, no qual se encontra um paralelo com a dialética estudante-professor de Gramsci focando na criação de consensos, discussão e internalização de novas ideias e técnicas. A intenção não foi buscar a liderança brasileira na América do Sul através de imposição, mas induzir um desejo de benefício mútuo que poderia embutir os interesses, aspirações e estratégias brasileiras discretamente na região .

A pergunta que parece pertinente sobre a estratégia brasileira com a IIRSA é como ela foi percebida pela Colômbia e se está motivando uma maior convergência entre os dois países. Nesse sentido o pesquisador Oscar Simmonds Pachón argumentou que o país andino se percebe como uma potência secundária na região, ou seja, a Colômbia se caracteriza por estar abaixo da potência regional (Brasil) em termos de capacidade e influência nos processos regionais, porém, com esse status, possui certo nível de liderança, não se sentindo meramente como seguidor das diretrizes que se estabeleçam desde a potência líder. Concluiu que em termos gerais, as potências secundárias não possuem a capacidade de condicionar a potência regional, mas sim tem a capacidade de coordenar e influenciar nas agendas externas e internas de outros países da região que apresentem menores capacidades que elas .

Pachón também apontou que a posição colombiana ainda continua muito atrelada aos interesses dos EUA, o que explica o porquê a Colômbia optou por desenvolver uma estratégia de internacionalização econômica e de desenvolvimento infraestrutural internas de caráter individual, pela qual não alcançou uma melhor articulação com os processos de integração conjuntos fomentados na América do Sul . O mesmo autor argumenta que ainda que esse modelo possa ter significado um incremento na capacidade infraestrutural nacional, também é certo que boa parte desses investimentos se direcionaram a atividade exportadora da Colômbia (transportes fundamentalmente) aumentando a eficiência e diminuindo os preços de seus produtos destinados especialmente aos EUA, porém alerta:

Desta forma, isso se entrecruza com o modelo exportador da Colômbia, o qual vem privilegiando os produtos mineiro-energéticos como principais mercadorias (estas ocupam mais de 60% da pauta exportadora do país), o que pode resultar problemático porque elas não se caracterizam por agregar muito valor ao sair do país. É possível pensar então que uma parte da falta de sintonia entre Colômbia e a IIRSA se deve às diferenças nos modelos de desenvolvimento que estão em jogo: por um lado, um de caráter regional e enfocado em um maior nível de industrialização e eficiência no fluxo de mercadorias e mão de obra: o da IIRSA; e por outro, um enfocado na exportação de recursos naturais para fora do continente como condição para uma internacionalização econômica, o da Colômbia .

Pachón concluiu que a Colômbia deveria pensar em uma regionalização que permitisse ao país contar com plataformas infraestruturais focadas nos processos produtivos e não meramente nos extrativistas, pois o aprofundamento do modelo neoliberal pode seguir reproduzindo uma das principais debilidades do país, ou seja, as desigualdades sociais, dificultado assim o país a alcançar um verdadeiro desenvolvimento integral .

Conclusões

As relações entre Brasil e Colômbia em linhas gerais apresentavam um padrão de distanciamento. No final dos anos 1970 a crescente influência dos EUA no país andino gerou preocupações entre os formuladores de política externa brasileiros, culminando no ápice de desconfiança mútua na implementação do PC em 1999. Porém, com a proposta da IIRSA em 2000 se gerou a possibilidade de convergências entre os dois países, tanto pela postura do Brasil em tentar fomentar uma iniciativa que aparentemente seria apolítica (integração da infraestrutura) como pelo movimento da diplomacia colombiana em fomentar uma maior diversificação de sua agenda externa tradicionalmente ligada somente à questão da Segurança Nacional.

Esse movimento apresenta suas limitações, tanto pelo lado do Brasil que não assume suficientemente os custos de uma possível liderança na integração regional, como pelo lado colombiano que continua dependendo do apoio dos EUA no combate às drogas e nos acordos de livre comércio.

Pelo lado brasileiro, dois problemas parecem centrais: a falta de investimentos nos países vizinhos tanto na área de segurança (papel limitado na resolução de conflitos na região) quanto na de infraestrutura, a qual desperta desconfiança em relação à atuação das empreiteiras brasileiras (muitas financiadas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES) na região e sobre os impactos ambientais e sociais das mesmas .

Em acordo com os analistas colombianos Eduardo Pastrana, Diego Vera e Oscar Simmonds Pachón parece correto afirmar que a Colômbia pode ser considerada uma potência secundária pelos seus atributos econômicos, militares e políticos, porém com uma política externa muito ativa na era Santos. É um Estado com grande potencial de conexões políticas e diplomáticas por sua estratégica posição geográfica e recursos. Seus interesses de diversificação comercial e atração de investimentos explicam sua nova convergência com o MERCOSUL e com a UNASUL. Como os autores citados argumentaram, alguns dos interesses colombianos com os EUA não se diluíram, mas nesse momento apresenta uma formulação de política externa mais autônoma e aberta e que busca criar a imagem de um “sócio confiável”, estável e maduro democraticamente, para situar-se no centro de gravidade dos processos de integração sul-americana.

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